A idéia deste post veio depois de ler uma reportagem do Guardian Books (http://www.theguardian.com/books/2013/nov/06/discussion-books-better-than-films-adaptations) comparando livros e filmes.
A reportagem começa analisando o filme Percy Jackson and the Sea of Monsters. O autor elogia o filme, que considera muito bem feito e fiel ao livro. Mas ainda assim cogita dos motivos que o levaram a ficar obcecado com o que ficou de fora e com o que foi mudado. E conclui que os livros são muito melhores porque permitem que o leitor sinta e viva tudo o que está se passando enquanto nos filmes o expectador é relegado à posição de mera testemunha de tudo o que acontece na tela.
Discordo.
Já assisti filmes e me senti vivendo tudo o que se passava ali. Também já me senti uma simples expectadora. Mas nesses casos era porque o filme não me conquistou e fiquei ali, olhando, vendo o que ia acontecer.
Acredito não ser possível comparar filmes e livros por um motivo muito simples: são linguagens diferentes utilizadas para contar uma história. É o mesmo que olhar para um prato de comida, sentir o cheiro, saborear e comer a comida com as mãos para saber como ela é no tato. Cada uma das formas de se provar a comida vai trazer uma experiência diferente. E apenas uma vai matar a fome, que é comer propriamente dito.
Livros permitem que o autor levem a pessoa que os le para qualquer lugar, inclusive para a mente dos personagens. Filmes são mais restritivos nesse ponto. Não dá para saber o que um personagem pensa a não ser que ele fale em voz alta o que está pensando. Livros, por outro lado, não tem sons nem cor. Sua linguagem está limitada às palavras. O autor precisa descrever tudo o que quer dizer porque tem apenas a fala para isso. E muitas vezes uma imagem vale mais do que mil palavras. Lembro de uma cena no filme Harry Potter e o Enigma do Príncipe em que Harry dança com Hermione ao som de Oh Children, do Nick Cave (de arrepiar) na tenda improvisada, tentando animá-la depois que Ron fugiu. Essa cena não existe no livro. As tentativas de Harry de animar Hermione acontecem durante dias e no livro é possível ver toda a frustração dele tanto por não conseguir pensar no que dizer nem conseguir animá-la com o pouco que consegue. Mas no filme, a cena da dança, consegue resumir tudo isso: ele tentado alegrá-la e fracassando. Foi uma idéia de gênio de quem elaborou a cena, que resume páginas e páginas.
Mas então, se livros e filmes não podem (ou pelo menos não deveriam) ser comparados, por que as pessoas insistem tanto na comparação? Acho que por um motivo muito simples: muitas vezes, livros são adaptados para filmes. E normalmente, sacadas de gênio com a contada no parágrafo acima são raras. Roteiristas precisam de mudar histórias, criar ou eliminar personagens, lugares, diálogos e cenas inteiras para adequá-los à linguagem específica dos filmes. Para quem não leu o livro a mudança é irrelevante. Para quem leu, é frustrante, por melhor que o filme seja. Afinal, quem vai ver o filme já tendo lido o livro, tem a expectativa de "ver" o livro novamente, ao vivo e a cores, com personagens de carne e osso, com som e luz. Mas como toda expectativa, a tendência a se frustrar é muito grande porque o filme nunca será como o filme.
Há sempre coisas que não podem ser transferidas para o filme. Na série A Song of Ice and Fire, uma das coisas mais engraçadas e interessantes são os pensamentos de Tyrion Lannister. Na adaptação da HBO não tem quase nada do que ele pensa porque ele não pensa em voz alta. Perde quem ve a série mas não leu o livro. E aí volto ao que já falei: a comparação entre livros e filmes só tem sentido quando um filme adapta um livro mas não tem sentido quando se analisa os dois como linguagens diferentes.
O ideal seria ir ver o filme esquecendo o livro. Mas a memória não deixa. A memória vai sempre querer repetir as emoções sentidas durante a leitura do livro. Piora quando o elenco não tem muito a ver com a descrição dos personagens do livro. Lembro do Lestat de Tom Cruise em Entrevista com o Vampiro enquanto fizeram Brad Pitt interpretar Louis, enquanto o tipo físico dos dois exigia que Brad Pitt fosse Lestat e Tom Cruise fosse Louis.
Eu gosto muito mais de livros do que de filmes. Mas não posso dizer que livros são melhores, objetivamente falando. São melhores para mim porque gosto mais da experiência de se ler um livro, mergulhar na história, carregando o livro para qualquer lugar. Mas há quem preferia filmes e para esses os filmes são realmente melhores.
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