quarta-feira, 11 de março de 2015

Carta ao Dr. Freud

Querido Dr. Freud,

Sinto ter que escrever essa carta no lugar de conversar pessoalmente com o Senhor. Afinal, de todas as pessoas que passaram por esse planeta nesses últimos 10 mil anos, o Senhor é uma das três com quem eu gostaria de passar horas conversando, especialmente com uma (ou várias xícaras) de café no meio. Mas infelizmente nosso timing não foi muito bom. Quando o Senhora faleceu em 1938, nem meus pais eram nascidos: nasceram na década seguinte.

Escrevo por dois motivos. O primeiro é agradecer. Graças ao Senhor minha vida hoje, depois de 05 anos de psicanálise, é muito melhor. Não posso dizer que sou mais feliz do que era antes. Mas posso dizer, com segurança, que aprendi a transitar entre os momentos de felicidade e tristeza sem me perder em nenhum deles.

Se a meditação me ensinou a parar o tempo,  o Senhor me ensinou a abrir espaço. Espaço para que coisas como tristeza, raiva, inveja, mágoa, ódio, ressentimento, desânimo e outras pudessem existir, coisas que sempre achei que não deviam existir e me recusava sempre a abrir espaço para elas. E foi o Senhor quem me ensinou que abrindo espaço para que elas existissem, elas deixariam de dar a última palavra na minha vida e seriam apenas mais uma coisa efêmera que chega, fica um pouquinho e depois se vai. Na realidade , Sidarta Gautama já tinha me ensinado que tudo é transitório e nada fica. Mas saber só não adianta. É preciso vivenciar isso. E foi mesmo o Senhor quem me ensinou como abrir esse espaço e essas coisas passaram a existir sem me incomodar.

Claro que nem sempre o espaço suficiente e muitas vezes acabo me perdendo. Mas como o Senhor também me ensinou, o espaço vai sendo aberto aos pouquinhos, devagarinho, sem a gente nem perceber e quando se dá conta elas já espaço grande e que não permite que nos afoguemos. Pelo menos na maioria das vezes. 

O outro motivo desta carta é saber a opinião do Senhor sobre as coisas que estão acontecendo agora. Será que o senhor iria gostar das redes sociais? Ou acharia que elas mantém as pessoas afastadas entre si sem que elas se deem conta, porque vivem sob um véu que simula uma proximidade inexistente? O que senhor diria dos muçulmanos fanáticos que se matam e levam junto um monte de gente só porque essas pessoas não acham que Maomé é o enviado definitivo de Deus?  O que o Senhor diria da idealização do sexo e sua alçada ao lugar mais alto das aspirações humanas? E do rock'n'roll? Será que o senhora pensaria que as pessoas hoje estão mais loucas do que no final do século XIX e início do século XX ou será que o senhor apenas concluiria que a loucura que acontece agora é apenas mais explícita, mais extrovertida do que a que frequentou seu divã? O Senhor acharia que depois de chegar à Lua e mandar um robozinho para Marte o ser humano ficou melhor? Ou acharia que é apenas mais uma compensação de alguma repressão? E os Cinquenta Tons de Cinza? O que o Senhor falaria da série? Fico curiosa, Dr. Freud.

Por outro lado,  fico feliz que o senhor não tenha sobrevivido para testemunhar o holocausto nem as bombas atômicas no Japão nem a destruição das torres gêmeas nos Estados Unidos. E cá entre nós, não tenho certeza se ficamos melhores ou apenas um pouquinho mais civilizados. E por falar em civilização, posso garantir ao Senhor que o mal estar continua.

Grande abraço.

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